TEATRO PARA DANÇAR

quinta-feira, 12 de outubro de 2017

O Bruxo de São Pedro da Aldeia irá apresentar o Clube do Teatro II...

Marcelo Tosta, um artista completo!
Um dos fortes nomes das artes em Cabo Frio, Marcelo Tosta é ator, diretor, escritor, artista visual e cineasta. Sua alma fica apertadinha dentro de seu corpo, de tanto transbordamento e energia que produz! Ele mesmo, o "Bruxo de São Pedro da Aldeia", traz a marca dos artistas que tem alma de artista, e sua fluidez criativa transborda em suas páginas nas redes sociais. 
Seus filmes, desvendam a alma humana, na simplicidade e desenho que as palavras propõem. Suas pinturas, belas, fortes, coloridas e únicas, já o seu teatro é denso, encorpado, profundo; transgride e transforma corpo do ator. Este é nosso Marcelo, este cigano sideral que pousou na nave mãe terra. Onde tem Marcelo, tem alegria, tem sinceridade, tem conversa boa, tem sentimento. Por isso o convidamos para ser o apresentador do Clube do Teatro II. Um encontro para jamais esquecermos.
Outro aspecto delirante de seu trabalho, é sua literatura. quem já viu seus textos, percebem uma sutileza e uma busca que vai lá  no vazio da existência, para enchê-la de paixão, de forma, de estrutura. Seus mergulhos entre uma e outra depressão é profundamente criativa, por isso, talvez, ele tenha de ficar tanto tempo recolhido, pensando e fluindo suas novas criações. Vez ou outra, Marcelo precisa estar entre nós, porque ele não é apenas um artista, mas um mensageiro de seu tempo. Um cara que veio pra fazer a gente lembrar que a arte é necessária e o instante é o agora.

Marcelo nos dirá um pouco de si, nesta entrevista exclusiva para o blog Teatro Possível.

"Eu nunca estive fora 
do movimento 
Teatral da cena de 
Cabo Frio, nunca! "

Clube do Teatro II, Encontro marcado entre artista e público!
Jiddu Saldanha - Como é mergulhar no mar de nossa região, pelo viés do teatro? Marcelo Tosta é esse mergulhador abissal da arte?

Marcelo Tosta - Quando penso em mim, buscando reconhecer no organismo os primeiros raios e registros da arte, penso imediatamente em uma criança sentada no meio da sala, desenhando e escrevendo nas antigas sacolas pardas de mercado para tentar minorar a sua ansiedade. Talvez um traço já constante de que eu precisasse comunicar e tivesse alguma espécie de canal aberto, creio neste canal em todos nós, para poder dizer daquilo que estivesse entre os mundos e entre os entres de nossas esferas, psico esferas. 
Lembro também de mim, trancado no fusca amarelo do meu pai, ouvindo a rádio MEC, mesmo não tendo sido apresentado pela minha família. É da parte da descoberta, do risco e dos frios quatro dedos abaixo do umbigo equidistantes do sexo. É do marejar tendo ainda que como registro, a mãe zelosa demais, gritando para que eu não nadasse para o fundo, para não me afogar no meio das águas da vida.  A arte e o meu trabalho com as possibilidades da arte, não começou exatamente quando numa igreja abandonada na época, emprestava como palco,  o altar para que eu pudesse reconhecer Vivaldi e ler “Sonhos de uma noite e Verão”, me fascinando com Píramo e Tisbe, com Puck, Com Anaïis Nin citada por Artaud e eu nem podia imaginar que pouco tempo depois eu estaria nos palcos dando voz a este homem que trespassado em correrias e gritarias de existência, assim como eu, também gritava. Com 15 anos, comecei a dividir o que eu tinha necessidade de expandir e investigar com um grupo de almas que variavam a mesma idade ou mais que a minha naquela época. E comecei a dirigir a cia de pesquisas teatrais Religare, que até hoje cumpre e compra a briga de existir e insistir, sem financiamento e nem apoios. 
Nadávamos contra a corrente, dos preconceitos, das torpezas e indignações diante da sensibilidade possível e que sempre era motivo de repúdio para que permanecidos na ignorância, fôssemos incluídos nas rodinhas da vida. Eu sempre fui marginal, das figuras que estavam à margem e que aprenderam que era exatamente do lado da borda de fora, que ficava o maior do mundo. Eu poderia falar intensamente sobre meus primeiros registros na arte, já que sempre me sinto renascido todos os dias quando me vejo diante de sensações e de possibilidades de registros, que me são orgânicas e inevitáveis. Eu não evito a sensibilidade e nem excluo de mim o estudo aprofundado da minha existência, das existências, insistências e vontades reverberadas no Nosso mundo. Ainda que me dissessem “NÃO”, eu, do lado de fora, estava dentro do quintal do maior do universo e para isso, Nunca! Um único verso, palavras infinitas.

"Eu não evito a 
sensibilidade e 
nem excluo 
de mim o estudo 
aprofundado da 
minha existência"

JS - Quais os momentos vividos no RJ que vale a pena lembrar?

MT - O Risco do percurso saindo da roça para a cidade de pedras, a vontade celebrada no peito, para poder estudar, sendo pessoa vista como impossibilitada e sem recursos, para investigar o teatro fora da cidade pequena. (suspiro e conto até dez!) A Martins Penna, meus amigos que guardo até hoje no coração, professora magnífica da Romênia, Mona Lazar! Miojo, miojo, miojo! Vontade de voltar para casa para ver TV nas tardes de sábado com a minha mãe. Descobertas de que o riso não era propriedade das pessoas “engraçadinhas” que me julgavam depressivo. Um grande reconhecimento por minha capacidade de fazer comédia, mesmo sendo um ator conhecido por imersões dramáticas e profundas, fazer rir é ter entendimento sem medo do mergulho na dor. Eu não me lembro somente do Rio, me lembro do mundo! O Rio que corre lá, não corre menos aqui, dentro do meu peito e dentro do magnífico movimento que nós, atores, jovens, velhos de alma e ávidos de desejo, fazíamos ser e existir e não apenas pesar sobre a Terra em Cabo Frio. Do Rio ainda tenho muito a colher. Mas muito mais quero plantar pelo mundo. Eu sou do mundo! Eu sou do mundo! Do mundo!

Num clique de Alexandra Arakawa - 2008
JS  - De volta no movimento teatral de Cabo Frio com a cena "O Último Delírio de Van Gogh", quais são suas expectativas?

MT - Eu nunca estive fora do movimento Teatral da cena de Cabo Frio, nunca! Talvez Cabo Frio tenha expelido ou fechado por um tempo de nova semeadura, segregação, reforma, os outros artistas que estavam sempre ali, mas não eram vistos. Não estou falando com arrogância, estou falando com verdade que precisa ser revelada de dentro de mim, diante da pergunta que me foi feita. Vanisse, foi um trabalho que até pouco tempo estava sendo mostrado e vivido com a mesma intensidade de todos os campos e cidades e pastos e  estradas. Em São Pedro, não para nenhuma instituição política, vivemos o incrível “Quilombo de Cal”,  no Rio e também aqui. Muitas coisas aconteciam e eram notificadas pelas redes sociais. Eu não fui a Europa, ainda, mas ela estava conosco aqui, em Cabo Frio e qualquer lugar, estava o Brasil inteiro. O mundo estava aqui, está em mim, eu estava aqui perto com a Cia Religare, bastava que fizessem menos barulho para também  nos ouvir. Tenho aprendido com o tempo, cada vez mais, que é inútil pensar em "contracenação" se não estivermos dispostos a fazer silêncio. 
O Silêncio é sagrado, nele há uma ruidosa e encantadora música e fala milenar do universo, nos dizendo sobre o que o Tempo, pode fazer por nós, agora. Agora quero fazer Van Gogh! E quero fazê-lo com a dignidade que ele merece por sua grandeza, mas antes de tudo, pela sua sensibilidade que só foi reconhecida depois de ter sido esmagada pela falta de olhos que o percebessem e o retirassem desse enquadramento absurdo e violentamente cruel do que chamam de loucura! Então,  tudo que espero é ter competência e humildade para fazê-lo, mesmo que sabendo que ele não precisa de mim para viver, porque permanece vivo e grita suas cores e orelha pelo mundo  muitas vezes, completamente surdo.

Ensaio poético visual por Alexandra Arakawa
homenagem a Marcelo Tosta...



"O mundo estava aqui, 
está em mim, 
eu estava aqui perto 
com a Cia Religare"

JS - O teatro tem jeito, tem como revigorar esta arte nesta Cabo Frio, neste Brasil?

MT - O Teatro precisa de coragem! Não se faz teatro sem coragem, sem riscos, sem mar, sem vida, sem fogo nas ventas, nas “partes”, no corisco. Na verdade eu penso que o país precisa do Teatro e que o Teatro precisa ser entendido de uma vez por todas como profissão, como legado, como tarefa absolutamente imprescindível para que aconteça alguma espécie de deslocamento de nossas zonas de conforto nada confortáveis. O teatro precisa de gente abusada, de gente puta, de puta, Salve as putas! De Santos mártires que gozem por Deus! E que entendam que Deus e o diabo, sempre tomam chá, juntos no final da tarde. Não existe esta coisa chata de se trabalhar sem ter ganhos, sejam eles físicos ou secundários. Todo ator merece respeito pelo seu TRABALHO e o teatro não pode deixar de ser considerado como uma grande alavanca possível e próxima de todos nós, para que possamos despertar o mundo do sono da ignorância. O país precisa de nós e não de elitização. O teatro é tão fundamental e urgente quanto a fome. Salve Antonin Artaud! Laroiê!

JS - Quem é Marcelo Tosta por Marcelo Tosta

"E que entendam 
que Deus e o diabo, 
sempre tomam chá, juntos
no final da tarde."


MT - Um homem nu diante do espelho, que não tem a menor pressa em colocar a roupa.


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