TEATRO PARA DANÇAR

domingo, 31 de agosto de 2014

De quando viramos manteiga derretida.

A trupe teatral FABRICARTE, agradou o público adulto e infantil ontem, dia 31 de agosto de 2014, no Teatro Municipal de Cabo Frio, Inah de Azevedo Mureb. Foi um show de encantamento com a cumplicidade de um público eclético. A peça teve uma "pegada" cênica que transformou até o expectador mais duro, "numa manteiga derretida"! Isso mesmo, não foram poucas as gargalhadas arrancadas das vísceras dos marmanjos que, junto com seus filhos, se esbaldaram de tanto rir, com direito a momentos de emoção. Sorrisos que não paravam de brotar, vindos de todas as direções.
Um pouco antes de entrarmos no teatro, um painel com fotos do grupo, mostrou que, durante os últimos 10 anos eles não pararam de trabalhar, e quem prestou atenção naquelas fotos, percebeu uma mesma formação de atores, com variações pra mais, em alguns espetáculos e sempre com um núcleo que se repetiu de um espetáculo para outro, sob a batuta de um mesmo diretor, Cesar Valentin. e que deu aos trabalhos, cada vez mais, a segurança de uma assinatura cênica com qualidade que só é possível conquistar, quando se respeita a qualidade e se defende uma marca.
As mudanças de textura e cor do cenário, ora por intervenção da iluminação, ora pela própria interatividade dos atores, deu grande vigor ao espetáculo.
Já o espetáculo da vez, "No Quintal da Imaginação", nos faz ver um elenco que entra em cena de forma simples. Ricardo Amorim, Manuela de Lellis e Rafaela Solano, se entregaram ás personagens e deixaram-se levar pelo contexto e o enredo da peça, assim, com seus corpos adultos na pele de crianças, fizeram suas performances focadas muito mais na ética do que na estética - explico  -  não era um exercício mirabolante de "linguagem contemporânea de teatro experimental chato"; foi apenas teatro e nada mais. Isso mesmo, aquela coisa milenar, onde, três atores simplesmente, decidem brincar e expor sua veia artística interpretando a forma mais traiçoeira de personagem: crianças, e, consequência de verdade cênica atenta, acabam arrastando o público para uma viagem incrível superando qualquer tipo de estereótipo com seus talentos certeiros.
Nada pode ser mais delicioso do que um cenário todo branco, que vai, aos poucos, sendo "pintado" de cabo a rabo pelas personagens. A peça começa completamente em branco e preto, com nuances de teatro de sombras e, de repente, uma guerra de tinta, pincéis e pós coloridos, dão cores ao espetáculo, causando frenesi no público que mal continha a vontade de invadir o palco; foram impedidos pela mão segura e atenta do diretor, Cesinha (Cezar Valentim) manteve tudo na quarta parede fazendo com que, a fluidez de cada cena acontecesse com um encadeamento e ritmo impressionantes. Destacou-se também, a profusão de adereços que foram surgindo de figurinos não menos surpreendentes. A harmonia entre cor e movimento, fez o espetáculo surgir aos nossos olhos como uma pintura modernista.

Manuela de Lellis, Ricardo Amorim e Rafaela Solano, saúdam uma platéia cheia. A família cabofriense compareceu e, pelo visto, gostou! Os aplausos foram conquistados, definitivamente.
Vale destacar a dramaturgia, um texto infantil que não pode, em hipótese alguma, ser confundido com "infantiloide". A caneta de Cesar Valentim é profunda e ao mesmo tempo alegre, deixou um rastro lúdico em cada respiração das cenas tão bem construídas. Foi bonito ouvir os estudantes-escritores do NUDRA (Núcleo de Dramaturgia do Oficena), comentarem sobre o excelente material disposto para a reflexão da platéia, como o fato de, a  peça tratar de um tema tão pesado como a censura e ao mesmo tempo questionar comportamentos políticos como a ditadura dos "marchas soldados", na verdade, as pequenas ditaduras existentes no seio da família brasileira, aquela que decide quando e como os filhos devem brincar, quando não os proíbem. Embora sejam "pancadinhas de amor", a ludicidade não mascarou a força do texto e a mensagem foi direto ao coração dos pais, que pareciam olhar para as crianças; dando razão às personagens da peça.